E nunca mais os reis usaram a coroa

E nunca mais os reis usaram a coroa
Fotografia: Tiago Canoso

Vila Viçosa. O nome vem da fertilidade dos solos e do encanto desta terra, que, apesar de pequena, é uma das mais belas do Alentejo. Conquistada aos mouros em 1217, só em 1270 recebeu foral, tornando-se vila. O castelo, esse, foi construído no século XIII, já no reinado de

Dinis, mas sofreu profundas remodelações ao longo dos tempos. A partir de 1520, o edifício foi transformado numa fortaleza de artilharia, de gosto e influência italianos, semelhante ao paço-castelo de Évora Monte. A planta quadrada, com dois torreões em ângulos opostos, e os mecanismos defensivos inovadores – galerias antiminas e canhoneiras fortificadas para fogo cruzado – fazem do castelo uma das jóias da nossa arquitectura militar.

Dentro das muralhas encontramos o Santuário de Nossa Senhora da Conceição, no lugar de uma antiga capela gótica que terá sido fundada por D. Nuno Álvares Pereira após a vitória em Aljubarrota. O Santo Condestável ofereceu depois a imagem da santa como sinal da devoção de um povo. Mesmo ao lado fica o cemitério, onde estão os restos mortais a célebre poetisa Florbela Espanca, que levou bem longe o nome da sua terra natal. Subimos estes muros medievais para contemplar o encanto da vila, com a Avenida Bento de Jesus Caraça e a Praça da República repletas de verdes laranjeiras, que espalham um fresco perfume.

O monumento mais icónico de Vila Viçosa é, no entanto, o Paço Ducal, que começou a ser construído em 1501, quando esta terra se tornou sede do ducado de Bragança. A fachada tem 110 metros de comprimento e é totalmente revestida a mármore da região. Lá dentro, é fácil perdermo-nos nas mais de 50 salas abertas ao público, que guardam notáveis colecções de pintura, escultura, mobiliário, tapeçaria, cerâmica e ourivesaria. Aqui descobrimos a mais expressiva colecção particular de porcelana chinesa da Península Ibérica e vemos de perto os coches e as carruagens da família real.

Em 1640, o duque de Bragança tornou-se rei de Portugal, como D. João IV, e o palácio perdeu alguma da sua importância. Contudo, o monarca não esqueceu Vila Viçosa nem Nossa Senhora da Conceição: como agradecimento pela vitória na Guerra da Restauração, coroou a imagem de Vila Viçosa como Rainha de Portugal nas cortes de 1646, tornando-a padroeira do país. Desde então nunca mais a coroa foi usada por nenhum rei. A imagem está coberta por ricas vestimentas, muitas delas oferecidas pelas rainhas e demais damas da Casa Real.

O Paço haveria de recuperar prestígio no século XIX, como residência de verão da família real, no tempo de D. Luís e D. Carlos. Este último dormiu aqui na véspera do seu assassinato, em 1908. A implantação da República em 1910 levou ao encerramento do Paço Ducal de Vila Viçosa, que, por vontade expressa em testamento por D. Manuel II, reabriu portas nos anos 40 do século XX, após a criação da Fundação da Casa de Bragança.